domingo, 23 de dezembro de 2012

Ô Cride, fala pra mãe

desenho e link mais abaixo da rede Pró-Menino, da Fundação Telefônica.

e quando se corta o cordão umbilical de verdade, talvez por volta dos sete anos, a gente sente a separação que nos diz secamente: olha, vocês são duas pessoas diferentes, daqui pra frente cada um faz seu caminho.  

e o caminho, é lógico, no comecinho tem que ser caminhado de mãos dadas, pra se observar junto as flores e as dores nossas e do mundo.  até que um dia (eu acho) as mãos também se separam e os olhos deste outro que virou outro com a sua ajuda começam a lhe mostrar flores e dores que você não tinha visto. 

certa vez o grandinho chegou verde, pálido, passando muito mal por ter assistido um filme que não devia, Jogos Mortais. foi na casa de um amigo. acontece que de certa idade em diante - que varia de gente pra gente - não se controla tudo que os filhos fazem. o que assistem, o que falam, o que brincam. e isso é bom, né - assim crescemos (nós e eles). mas não é fácil, essa constatação e esse movimento, esse corte no cordão.  

é que mesmo que não se controle, as mãos estão dadas e, aí, a voz e a escuta são mais importantes - conversas. esse, penso eu (faço eu), é o jeito de lidar com as porcarias a que nossos pequenos estão expostos. eu falo isso tudo porque a maternagem vem cheia de conflitos, de perceber que as crianças, as nossas crianças!, vivenciam em outros lugares experiências que nós não queríamos, que nós não nos preparamos. o preparo não é só das crianças, mas nosso também.


eu concordo (como não?) com o Frank La Rue, da ONU, que disse que 
"se um discurso vai contra os direitos das 
crianças não pode ser enquadrado dentro da liberdade de expressão, mas na violação dos direitos humanos."  
porque nem sempre estamos perto, porque junto com a infância está também a vulnerabilidade, acrescento eu.

eu tenho um sonho. que onde haja crianças, os adultos que estiverem por perto cuidarão das crianças. mesmo que não haja qualquer forma de ligação afetiva. um cuidado pelo simples fato de serem crianças. 
sonho, né. mas eu sonho.

e assusto de ver um partido político (PTB) propor que não haja multas para emissoras de rádio e televisão que passarem programas inadequados para crianças em horário diverso do autorizado. dizem que vai contra  a liberdade de expressão. balela, papo furado! porque é ingenuidade pensar que liberdade é fazer o que se quer como se quer quando se quer. liberdade trata de assumir o que se faz e dividir as alegrias e os conflitos destas decisões. 

e se nós decidíssemos andar pra trás e passar qualquer programa em qualquer horário, teríamos que assumir que esta escolha torna as crianças mais vulneráveis ao que não estão preparadas. pra que lidar com essas dores de um jeito agressivo, violento e duro? eu não faço essa escolha, eu escolho a proteção. a infância. o preparo gradual. conversado.

(e por acaso de repente me encontro com Mandela: "a alma de uma sociedade reside no modo como ela trata suas crianças".)

eu não gosto de televisão, eu não gosto de filmes que o grandinho assiste. mas eu tenho que entender que ele não é eu e ele gosta. mas ele tem que entender também porque eu não gosto. e assim caminhamos de mãos dadas. o preparo quem dá somos nós, ao mesmo tempo em que nos preparamos. 
eu penso.



sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

O fim do mundo

o grandinho: mãe, hoje eu tenho que ficar acordado até meia noite, hein. 
por que, filho? 
porque se o mundo acabar eu quero ver.

****

enquanto brincava de boneca, a pequena consolou sua filha: calma, o fim do mundo não vai acontecer. o fim do mundo vai ser quando todas as pessoas do mundo morrerem. e aí 
você vai morrer também.


quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

domingo, 16 de dezembro de 2012

E é difícil...


“Vocês dizem: “Cansa-nos ter de privar com crianças”. Têm razão. Vocês dizem ainda: “Cansa-nos, porque precisamos descer ao seu nível de compreensão”. Descer, reibaixar-se, inclinar-se, ficar curvado. 
Estão equivocados. 
Não é isto que nos cansa, e sim, o fato de termos de elevar-nos até alcançar o nível de sentimentos das crianças. Elevar-nos, subir, ficar na ponta dos pés, estender a mão. 
Para não machucá-las.” 
(Korczak 1981, p. 11) 

Helena Singer.  República de Crianças. Mercado de Letras, 2010, p.  77


terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Leitura

a pequena olha pra sala e diz com sua vozinha de menina: começa com BA e termina com BUNÇA.


segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Grifo dele

se nossa imaginação só imagina a partir daquilo que já vimos ou se criamos algo realmente novo pela imaginação, eu não sei. mas já discutimos sobre isso, eu e o grandinho, e pensamos que tudo depende do que já se viu.

por um ou por outro, o grifo foi criado pelo já conhecido - um leão  e uma águia.

o grandinho, desde que tem O Grande Livro dos Seres Fantásticos, sabe bem destes seres. 

que nome mais apropriado, não? Fantásticos!
o são, realmente.

pois que de repente um dia ele me falou, enquanto eu cozinhava: tive uma ideia: vou criar um grifo. 

_ahn? Como assim, criar um grifo?

_assim: eu vou estudar bem a anatomia de um leão e de uma águia pra saber como juntar os dois e fazer um grifo. só que um grifo é gigante, né, e o meu não vai ser. mas aí, sabendo como é o corpo de cada animal, eu posso congelar eles, fazer toda a cirurgia pra juntar os dois e depois descongelar pra voltar a viver, mas, aí, já como grifo.

(não pude deixar de dizer)
_sabe que uma das maiores discussões das ciências hoje em dia é sobre a nossa possibilidade (ou não) de mexer desse jeito com a vida, de fazer clones, de trabalhar com células  de fetos pra fazer pesquisas, coisas mais ou menos assim...

_é... - ele ficou pensativo.

_na verdade - continuou - eu queria mesmo era fazer um pégasus, mas aí ia ser complicado, como é que eu ia alimentar o pégasus? porque uma das coisas legais de ter um bichinho é poder alimentar, né, dar comida... mas o pégasus pasta nos campos do Olimpo... então eu decidi criar um grifo, mesmo. ele come cavalos, come homens, come tudo quanto é carne. se ele for comer um cavalo e tiver um cavaleiro em cima, vai junto! mas aí eu dava alguma outra coisa pra ele.

lembrei-me de um desenho que tinha visto há alguns dias. imaginei o grandinho.

Gracias ao Laerte  por autorizar publicação de seu desenho!

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Da saudade e de como matá-la

depois de duas semanas longe, recebi um e-mail assim:


dizeres da pequena:
"estou sentindo que meu coração está quebrado,
mas quando eu abraçar a mamãe ele vai ficar bom de novo.
mamãe, eu te amo!"



como que cortou meu coração também, decidi consertá-los - o meu e o dela. respondi:

"mostra a ela essa colagem que fiz e diz que eu falei assim:
amanhã a gente vai ficar desse jeito!
eu também te amo!"


fiz que fiz pro prometido ser cumprido. no amanhã, estávamos assim, juntinhas. com o cartão entregue ao vivo, ela também me entregou um:




e, então, saudade matada por morte morrida a abraços e beijos, eis a representação máxima da saudade:



(pela pequena)



domingo, 2 de dezembro de 2012

Peraltagem

"...e porque a tarde ficasse mais comprida a gente 
sumia dentro dela. [...]"



Manoel de Barros
Memórias Inventadas: a terceira infância
VI
2008.